Correspondência: Virginia Woolf e Victoria Ocampo
Missivas em torno de escritas que flertam com o feminismo na arte
O que Virginia Woolf e Victoria Ocampo têm em comum? As escritoras inglesa e argentina se uniram pelo amor à literatura através de vasta correspondência em torno de suas rotinas de escrita, leitura e pulsão de vida (ainda Woolf desejava viver) no livro Correspondência - trazido ao Brasil pela Bazar do Tempo com tradução conjunta de Emanuela Siqueira, Nylcea Pedra e Rosalia Pirolli, numa edição caprichada com organização da pesquisadora argentina Manuela Barral.
Ocampo conheceu Woolf em Londres em 1934: Virginia Woolf já consagrada com Um teto todo seu e Victoria Ocampo ainda tateava sua influência em Buenos Aires. Ambas reconheceram almas afins e um desejo de escrita que perpassa a relação do feminismo com a arte.
Quando a escritora argentina estava em Londres, visitou uma exposição do fotógrafo Man Ray e encontrou a britânica na mesma exibição. O primeiro e único desentendimento de ambas se deu porque Ocampo iria insistir para que Woolf fosse fotografada em cores pela fotógrafa Gisele Freund. Virginia hesitara. Mas foi capturada em um dos momentos mais singulares de toda sua vida: uma expressão leve, sem a postura aristocrática que lhe era comum.
[ Virginia Woolf retratada pela fotógrafa Gisele Freund ]
Em dado momento, Woolf confessa à Vita Sackville-West: “Estou apaixonada por Victoria Ocampo”. Essa paixão, no entanto, será sentida com certa distância, numa amizade além mar - o que o Atlântico separou, as duas escritoras uniram em torno de suas cartas.
As missivas irão de 1934 a 1940. Um ano antes da morte de Virginia Woolf, ao se atirar no Rio Ouse. As cartas da inglesa não sugerem nenhuma melancolia além do “natural” de uma escritora que tinha plena consciência de si e de seu ofício. Ocampo não intuira o que estava por acontecer em 1941.
A carta inaugural do livro enviada pela inglesa data de 27 de novembro de 1934 e já demonstra o clima de camaradagem que envolveu as duas.
Em certa carta, Victoria Ocampo escreve: “Sou uma pessoa voraz. E acredito que ter fome é tudo. Não tenho vergonha de ser faminta. Você não acha que o amor é nossa fome de amar? […] Quero dizer que nossa fome é um elemento muito importante”.
Para a argentina “as coisas só existem de verdade para nós quando e porque temos fome delas e na medida em que essa fome é imensa”.
Já descobrimos o que uniu as duas escritoras. A fome do mundo que é a origem e razão de se escreve. Para criar uma obra literária, é preciso ter “fome do mundo”.
Woolf seguia reafirmando sua posição feminista nas letras, ao escrever para Ocampo: “Minha única ambição é um dia chegar a escrever, mais ou menos bem ou mal, mas como uma mulher”.
P.S: Lançado este ano, Correspondência já figura como um dos meus livros preferidos porque dá a ver os bastidores da vida de duas grandes escritoras do século XX.
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Um abraço,
Fernanda.